O velho cobertor

A chuva mais uma vez cai, só pra não ser diferente, estou enrolada neste cobertor tão antigo, mas é o que me entende, não me faz promessas, só me esquenta o corpo, me deixa falar o quanto eu quiser, me conforta e não se importa se o molho com a água que cai de mim, não se importa com os sonhos que se esvaem por cada término e sonhos que chegam por cada recomeço, 'mera ilusão', diria meu cobertor se falasse.

Ele não rebate meus xingamentos, mas também não tira minhas dúvidas, só me escuta, me esquenta. A chuva em fim deu uma trégua, mas o dia está quase nascendo e não consegui fechar minhas palpebras.Agora que a claridão invadiu meu quarto, não preciso mais do meu cobertor, talvez seja abandono, mas sei que tudo passa, inclusive a chuva que parecia interminável e a necessidade de me agasalhar é mínima, acho que fiz o que fizeram comigo, usei até quando necessitei, até quando me escutou, foi molhado com minhas lágrimas, e agora? não preciso mais dele e o guardo numa dispensa antiga e sem valores? até que a chuva venha e tenha necessidade dele novamente? Não, isso não está certo.Vou usá-lo até quando os meteorologistas disserem que vai fazer muito calor, até quando ele estiver muito velho,vou usá-lo até conseguir escutar suas dores, por ter me suportado por tantos Invernos, vou fazê-lo feliz até nos Verões,vou sentir ele me esquentar, mesmo quando seu tecido não esquenta mais nada, remendar cada desgaste,vou cuidar o tempo que for como não cuidaram de mim.